Câmara aprova PL da Dosimetria com apoio decisivo do Centrão e votos de partidos do…

A madrugada desta quarta-feira (10) entrou para a história política recente do país. Sob um clima de tensão, articulações de última hora e olhares atentos nos painéis de votação, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei que reduz as penas dos envolvidos na trama golpista e nos atos antidemocráticos de 8 de Janeiro.

Conhecido como “PL da Dosimetria”, o texto passou com 291 votos favoráveis e 148 contrários, selando uma das decisões mais controversas do Congresso neste ano. Com a aprovação, o projeto segue agora para o Senado Federal — levando consigo impactos diretos sobre o futuro jurídico de figuras centrais da política nacional, entre elas o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

O coração do projeto

O foco da proposta é alterar a forma de cálculo das penas impostas aos condenados. Em vez de somar condenações de forma cumulativa, o texto estabelece critérios, percentuais mínimos de cumprimento e novas regras para progressão de regime.

Para evitar o que o relator classificou como “insegurança jurídica”, o projeto deixa explícito que a remição da pena pode ser compatível com prisão domiciliar, um ponto que provocou reações imediatas nos bastidores e nas redes sociais.

Pelo texto aprovado, pessoas condenadas por “exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado” deverão cumprir ao menos 50% da pena.

É justamente nesse enquadramento que se encaixa Jair Bolsonaro, condenado pelo Supremo Tribunal Federal a 27 anos e 3 meses de prisão, com agravante por liderança de organização criminosa. A mudança no cálculo pode significar uma redução significativa no tempo efetivo de encarceramento.

A decisão que pegou o governo de surpresa

A inclusão do projeto na pauta foi anunciada poucas horas antes da votação pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), após reunião do colégio de líderes. Segundo ele, o tema já dominava os debates internos da Casa ao longo de todo o ano.

“Nada mais natural do que chegarmos ao final do ano com a posição final da Casa”, afirmou Motta, tentando dar um tom de normalidade a uma decisão que incendiou os bastidores políticos.

Mas o gesto teve custo. Parlamentares da base governista reagiram com indignação, alegando que o Planalto não havia sido avisado previamente. Mesmo após encontro com a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, na véspera, a inclusão do projeto foi vista como um movimento unilateral.

Como revelou a CNN Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi pego de surpresa. Aliados próximos consideraram que faltou transparência por parte da presidência da Câmara em uma pauta de tamanho impacto institucional.

Um caminho construído sob pressão

O avanço do projeto começou ainda em setembro, quando o plenário aprovou a urgência de uma proposta que previa anistia aos condenados pelos atos antidemocráticos, de autoria do deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ).

A relatoria ficou com Paulinho da Força, que iniciou um intenso périplo político em busca de consenso. Partidos do Centrão passaram a defender uma revisão das penas como alternativa viável diante da resistência à anistia total.

O relator, porém, enfrentou fogo cruzado. Governistas rejeitavam qualquer mudança. Já aliados mais fiéis de Bolsonaro exigiam uma “anistia ampla, total e irrestrita”, descartando inicialmente qualquer proposta intermediária.

O acordo silencioso

A votação desta terça-feira só foi possível após um acordo de bastidores entre Hugo Motta e o PL, que garantiu a votação sem apresentação de destaques — manobra decisiva para evitar atrasos ou alterações no texto.

Para o líder da bancada liberal, a aprovação representa apenas o começo:
“Este é um primeiro degrau”, afirmou, sinalizando que o objetivo final continua sendo a anistia completa.

Um Congresso dividido, um país atento

A aprovação do PL da Dosimetria expôs, mais uma vez, as fraturas profundas do Congresso e reacendeu o debate sobre punição, responsabilização e memória democrática.

Enquanto o texto avança para o Senado, o país observa em silêncio — consciente de que a decisão tomada na madrugada pode redesenhar não apenas penas, mas o rumo político e institucional dos próximos anos.

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