“Ele não caiu, ele foi agredido”: o dia em que uma escola particular de Caxias do Sul viu a confiança ruir
Na manhã clara de segunda-feira, 18 de agosto, a rotina da Escola Infantil Xodó da Vovó, em Caxias do Sul, parecia seguir o curso de sempre. Crianças corriam pelo pátio, as vozes infantis ecoavam pelos corredores, e a confiança dos pais repousava na segurança dos muros da instituição que cuida de cerca de 90 alunos. Mas, entre aquelas paredes, uma cena brutal mudaria tudo.
As câmeras de segurança registraram o momento em que a professora Leonice Batista dos Santos, 49 anos, perdeu o controle. O vídeo mostra a educadora, antes considerada de confiança, gritar com um menino de apenas quatro anos. Segundos depois, o gesto: uma pilha de livros é arremessada contra o rosto da criança, com força suficiente para que o impacto seja audível na gravação.
O menino, atônito, chora. A professora, então, o leva ao banheiro. À direção da escola, tenta justificar: teria sido uma queda. Mas a verdade não demoraria a vir à tona.
A descoberta da mentira
Desconfiados, os pais da criança insistiram em levar o filho ao dentista. O exame revelou a gravidade da agressão: seis dentes amolecidos, lesão impossível de ser explicada por uma simples queda. Ao acessar as imagens de segurança, a família encontrou a prova que desmentia a versão da educadora.
“Foi uma sensação de impotência, de raiva e dor”, relatou um dos familiares à polícia. O caso foi imediatamente registrado, tanto pela família quanto pela própria escola, que acionou a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA).
A delegada Thalita Andrich instaurou inquérito por lesão corporal e confirmou que a prioridade é proteger a vítima. “O vídeo e o laudo deixam claro o que aconteceu. Agora precisamos ouvir os envolvidos e concluir a investigação”, explicou.
O impacto na escola
Para o diretor da instituição, Cristhian Segatto Ferreira, a revelação foi devastadora. Leonice era vista como uma profissional de confiança, parte da rotina escolar. “O que mais nos chocou foi a frieza dela ao ser confrontada com as imagens. Não demonstrou arrependimento”, declarou.
A escola, que atende famílias da região há anos, anunciou o desligamento imediato da professora. Em nota oficial, pediu desculpas públicas e garantiu apoio psicológico e jurídico à família do aluno. “É um episódio que nunca deveria ter acontecido. Nossa missão é proteger e educar, e não descansaremos até restabelecer a confiança dos pais”, afirmou a direção.
A indignação que ultrapassa os muros
A notícia da agressão rapidamente se espalhou pela cidade. Nas redes sociais, mães e pais de alunos compartilharam mensagens de indignação, pedindo punição exemplar. Para muitos, a violência expôs uma ferida maior: até onde as crianças estão realmente seguras, mesmo em instituições particulares?
“Colocamos nossos filhos na escola com a certeza de que estarão protegidos. Ver uma cena dessas é revoltante. Essa mulher não pode voltar a dar aula”, comentou uma mãe em um grupo de pais.
Especialistas em educação infantil alertam que episódios como este, embora raros, exigem protocolos rigorosos de seleção, capacitação e monitoramento de profissionais. “A violência contra crianças em ambiente escolar é inadmissível. Mais do que nunca, precisamos discutir a formação emocional e psicológica de quem está à frente da educação básica”, analisa a pedagoga e consultora educacional Marta Oliveira.
A espera por justiça
Enquanto a investigação segue, a professora Leonice Batista dos Santos ainda não se pronunciou. Sua defesa não foi localizada pela reportagem. Caso seja indiciada e condenada, ela poderá responder por lesão corporal, crime previsto no Código Penal, cuja pena varia de três meses a um ano, podendo ser aumentada em situações que envolvem crianças.
A família da vítima, no entanto, pouco fala em punição. Prefere o silêncio, o cuidado com o filho e o amparo dos mais próximos. “O que queremos é justiça, mas, acima de tudo, queremos que nosso filho volte a sorrir sem medo”, disse o pai em conversa reservada.
Na pequena escola de Caxias do Sul, a rotina tenta retomar o curso normal. Mas, para quem viu as imagens, nada será como antes. O eco do impacto dos livros contra o rosto de uma criança permanece como lembrança de que a confiança, quando quebrada, não se reconstrói facilmente.
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