“A pior dor do mundo”: jovem mineira inicia tratamento experimental com cetamina pelo SUS após seis cirurgias sem sucesso

Bambuí, cidade pacata no Centro-Oeste de Minas Gerais, acompanha, comovida, a luta incansável de Carolina Arruda, 28 anos. Desde a adolescência, ela vive com um diagnóstico raro e cruel: a neuralgia do trigêmeo, uma das condições neurológicas mais dolorosas já descritas pela medicina, responsável por crises tão intensas que a doença ganhou o apelido sombrio de “doença do suicídio”.

A rotina de Carolina é marcada por cuidados extremos e constantes interrupções. Um vento frio no rosto, um gole de água, um simples sorriso — qualquer estímulo, por mais banal que pareça, pode desencadear uma dor lancinante, comparada por pacientes a descargas elétricas repetidas e incontroláveis. No caso dela, o sofrimento é ainda mais incomum: as crises atingem os dois lados do rosto e, diferente de muitos pacientes, nunca cessam completamente.

Nos últimos dez anos, Carolina passou por seis cirurgias — todas sem o resultado esperado. O nervo trigêmeo, responsável por transmitir sensações da face ao cérebro, segue enviando sinais distorcidos e explosivos de dor. Entre internações, tratamentos, medicamentos e períodos de melhora breve, a jovem sempre precisou recomeçar. Agora, inicia mais uma etapa, talvez a mais ousada de todas: um tratamento experimental com cetamina, viabilizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

A decisão veio após longas conversas com o médico Carlos Marcelo de Barros, que acompanha de perto casos graves de neuralgia. A proposta não é uma cura, mas uma tentativa de “reiniciar” o sistema nervoso central para que o cérebro de Carolina volte a responder aos medicamentos convencionais.

A cetamina, conhecida há décadas como anestésico, nos últimos anos ganhou espaço como aliada em casos de dor crônica resistente e depressão severa. Segundo o cirurgião neurologista Bruno de Castro, o fármaco age bloqueando receptores ligados à amplificação da dor, além de promover, no caso da depressão, uma espécie de “reconexão” entre neurônios danificados pela doença.

image-525 "A pior dor do mundo": jovem mineira inicia tratamento experimental com cetamina pelo SUS após seis cirurgias sem sucesso

O procedimento, entretanto, está longe de ser simples. A infusão é feita exclusivamente em ambiente hospitalar e, para pacientes como Carolina, exige sedação profunda. A substância pode provocar alterações súbitas de pressão arterial, ritmo cardíaco, respiração e percepção da realidade. Há ainda relatos de tonturas, náuseas e experiências dissociativas — como a sensação de “estar fora do corpo” —, o que torna indispensável o monitoramento constante por equipe especializada.

“Não é um tratamento para qualquer pessoa e nem para qualquer tipo de dor”, reforça o Dr. Carlos Marcelo. “Estudos mostram resultados promissores, mas ele só é indicado para casos selecionados, sempre com acompanhamento rigoroso.”

Na última semana, Carolina usou suas redes sociais para falar do que estava por vir. Entre mensagens de apoio e orações, escreveu um pedido simples: “Me desejem sorte”.

Agora, cercada pela família, pela equipe médica e por milhares de seguidores que acompanham cada capítulo de sua luta, ela se prepara para mais uma batalha. Para Carolina, a esperança não está apenas no alívio da dor, mas na possibilidade de voltar a viver — comer, conversar, sorrir — sem medo do próximo disparo elétrico que há anos prende sua vida em um estado permanente de tensão.

E em Bambuí, todos aguardam, com o coração apertado, para saber se essa nova tentativa, enfim, trará a paz que ela tanto merece.

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